Expografia Casa Rural Portuguesa de Sobrado é atração no Casarão José Rufino em Areia (PB)

A expografia da Casa Rural Portuguesa de Sobrado – Casarão José Rufino, tem como referência em sua concepção, três museus nacionais: o Museu da Língua Portuguesa em São Paulo, o Memorial da Resistência na Estação Pinacoteca em São Paulo e o Museu Digital de Campina Grande/PB, nos quais as narrativas se dão por meio de elementos audiovisuais.

O processo de curadoria e expografia assinado pelo professor Radamés Rocha e executado pela Prefeitura Municipal de Areia, partiu de referências para tratar um espaço de memória e sofrimento e construir uma narrativa midiática com infográficos, mapas, linhas do tempo, recursos audiovisuais, como documentários em vídeos, fotografias e polifonias.

Divulgação

A expografia dividiu os ambientes da casa em espaços museológicos que retratam, cada um, um período histórico referente ao Casarão e atrelado à história de Areia. Na recepção da primeira sala, a biografia do Francisco Jorge Torres e sua relação com a cidade. Posteriormente avançamos para a sala, o coração da casa, intitulada de Terra da Cultura, concomitantemente com a sala Areia – Terra de Lutas.

A área da cozinha, espaço de “socialização” entre os escravizados, intitulada de Areia – Encontro de Culturas, desenvolve-se entre os povos africanos e europeus partindo para as alas das senzalas ou dormitórios. Para a ocupação destes espaços, senzalas, há uma narrativa em forma de linha do tempo que inicia com os movimentos de resistência em prol da abolição da escravatura, já impulsionados na cidade, iniciando-se com a reprodução de algumas cópias de batistérios do arquivo da Paróquia de Nossa Senhora da Conceição de Areia como meio de registro dos escravizados.  Posteriormente, a reprodução dos bilhetes de rifas que a Irmandade do Rosário dos Pretos de Areia promoveu para arrecadar fundos para a compra de cartas de alforrias. Na sequência, a reprodução de Jornais da época com notícias de movimentos acirrados contra a escravidão, seguido de um exemplar de grilhão do acervo do MURA/Areia, como objeto de suplício e castigo.

O espaço reservado para a memória e sofrimento, apresenta o nome dos 18 escravizados do inventário post mortem de Maria Franca Torres, esposa do Marinheiro Jorge Torres, que possivelmente habitaram estes espaços. Esta senzala apresenta prospecção arqueológica protegida por vidro que revela o piso em solo natural com linhas mestras em tijolos enquanto a circulação possui tijoleiras remanescentes do salvamento de peças. Finalizando a sequência, temos a reprodução de notícias de 03 de maio de 1888, data oficial da libertação dos escravizados em Areia, antecipando-se à Lei Áurea.

No piso superior, temos montado um simulado do Tribunal do Júri, com mobiliários do acervo do Tribunal de Justiça da Paraíba. Dedicamos também duas salas para os Quilombos Bonfim e Mundo Novo, nas quais revelam seus movimentos de existência e resistência. E finalizamos no sótão com o toque de 07 dobrados da Filarmônica Abdon Felinto Milanez Filho, exibidos em suas alvoradas pelas ruas da cidade, conduzindo o olhar do visitante para a Janela Instagramável e sua visualidade para a Igreja Matriz. A conclusão do roteiro é na sala das prospecções arqueológicas, arquitetônicas e históricas, na qual disponibilizamos o acesso do volume único das pesquisas desenvolvidas por meio de QRCode.

A Casa Rural Portuguesa de Sobrado – Casarão José Rufino, é um espaço museológico que retrata a história do Marinheiro Jorge e sua importância para a criação da Villa Real do Brejo de Areia e sua ligação com a cultura afro-brasileira, mostrando os movimentos de luta e resistência do povo negro que ali habitou e hoje resiste em resiliência nas comunidades quilombolas Bonfim e Mundo Novo no município de Areia, escrevendo uma nova historia de conquistas.

Aberto ao publico diariamente das 9h as 16hs. Taxa de visitação R$3,00.

História

O primeiro sobrado da Vila de Areia, finalizado em 1818, foi construído para ser a casa da família de imigrantes portugueses, Maria Franca Torres e Francisco Jorge Torres, conhecido como “Marinheiro Jorge”. O imóvel foi herdado pela filha do casal, homônima Maria Franca Torres, e seu marido Santos da Costa Gondim. Em seguida, a neta do marinheiro, Adelaide Joconda da Costa Gondim (Iaiá), com seu marido Rufino Augusto de Almeida, habitaram de 1895 a 1907 e mantiveram comércio nas dependências com portas para a rua no térreo. Iaiá, teve cinco filhos: Maria Eugênia, Elpídio, Pedro Augusto, José Rufino e Horácio de Almeida que nasceu no sobrado.

Há indícios que a presença do Marinheiro Jorge e suas aspirações ao cargo de capitão-mor influenciaram a definição urbana de implantação da Villa Real do Brejo de Areia, porque o centro ou grande praça onde localizam-se a igreja, a casa de câmara e cadeia e as representações administrativas estão nas imediações das suas propriedades “Macaíba, dos sítios do Pirunga e do Bonito” atual vale ao sul e área do Colégio Santa Rita em direção ao campus da UFPB, além do seu sobrado de morada estar implantado em situação privilegiada neste largo. Outro fator importante a considerar, é que as datações de ocupação urbana da vila entre 1801-1850 correspondem ao mesmo período de vida do Marinheiro Jorge em Areia.

Em 1910 foi vendido para a família Chianca, que manteve anexo comércio de armarinho denominado “A Confiança”, sendo habitado por Filipe, Leopoldina e Ana. O imóvel passou por intenso processo de degradação ao ponto crítico de, na década de 1960, apresentar características de abandono.

Em 1971, o prédio foi arrematado por José Rufino de Almeida em hasta pública e retorna ao patrimônio da família. Entre 1971 e1975, José Rufino custeou a restauração do imóvel considerando as práticas de sua época e com resgate afetivo da história do seu bisavô o Marinheiro Jorge, designando para a obra o seu filho, o engenheiro Antônio Augusto de Almeida, que integrava a equipe técnica de restauro do conjunto franciscano em João Pessoa.  

Em 1979, devido ao falecimento de José Rufino, o imóvel foi herdado por sua companheira Nilza e filhas que habitaram o imóvel, mas tiveram problemas de manter a sua conservação, e no início da década de 1990 o venderam ao Tribunal de Justiça da Paraíba. Entre 1995 e 1997, o TJ-PB adaptou as instalações do sobrado para o novo uso de Fórum da Comarca de Areia que funcionou até o início do século XX quando houve a construção e mudança para um prédio moderno.

Mais uma vez sem ocupação e uso volta degradar-se e, numa ação conjunta do IPHAN, IPHAEP, TJ-PB e Prefeitura Municipal de Areia, firma-se o Termo de Compromisso nº 85/2006 para cessão de uso do imóvel em caráter de cooperação com finalidade de ocupar o espaço com atividades culturais e turísticas, sendo reaberto em 17 de março de 2007 após obras de recuperação realizadas com orientação técnica e recursos do IPHAN.

A recuperação previa novos espaços para a comunidade com: o Memorial da Justiça da Comarca de Areia; o receptivo da Secretaria de Turismo Municipal; e as atividades de extensão da casa do Patrimônio do Iphan-PB, em face do tombamento em 2005 pelo IPHAN do Conjunto Histórico, Urbanístico e Paisagístico da Cidade de Areia.

Durante o período de 2018 até os dias atuais, o imóvel vem passando por algumas intervenções de conservação. Em janeiro de 2023, as tijoleiras de algumas salas do térreo apresentavam estado de degradação avançado e a Prefeitura Municipal empenhou recursos na sua substituição, contudo, um descompasso na equipe técnica promoveu alguns danos em pisos e soleiras. Como solução, foi firmado um Termo de Compromisso entre o IPHAN-PB e a Prefeitura que contratou equipe especializada para desenvolver projeto de reversão de danos que vem a consolidar a integridade do imóvel de acordo com sua trajetória histórica e suas técnicas construtivas.

Foram desenvolvidas pesquisas multidisciplinares, onde aconteceram ações de arqueologia da arquitetura com o suporte de pesquisa histórica complementar e cadastro arquitetônico do edifício. Inúmeras foram as descobertas realizadas pela equipe de historiadores, arqueólogos e arquitetos, coordenados pelo arqueólogo e historiador Ulisses Pernambucano e Carmen Muraro, arquiteta de restauração. Toda a pesquisa foi acompanhada de perto pelo Escritório Técnico de Areia – ETA/IPHAN-PB nas pessoas de Natallia Azevedo, arquiteta, e Maria Aparecida Macedo, assistente administrativa, além do Superintendente do IPHAN na Paraíba, Emanuel Oliveira Braga, e pela Prefeitura Municipal de Areia, nas pessoas da prefeita Silvia Cunha Lima e da secretária de infraestrutura, Fabianna Perazzo.