Europa

História de Lisboa, cidade do mundo

Século XVII – óleo sobre tela de autor desconhecido

Escrever sobre a capital de um país que já foi um dos maiores impérios da história da humanidade não é uma tarefa fácil. Principalmente quando esta começou a ser habitada bem antes de Cristo. Com muitas invasões e influências de tantos povos, conseguir, em poucas páginas contemplar todas as passagens históricas é impossível. Portanto, escreveremos aqui apenas os fatos que foram mais decisivos na trajetória social e econômica de Lisboa.

A história de Lisboa esteve sempre ligada ao mar por sua posição estratégica na foz do rio Tejo. Tanto é que foram inúmeros nomes dados a ela por várias civilizações que aqui permaneceram ao longo dos séculos. Teorias e estudos não faltam para esclarecer a etimologia correta de seu nome. Muitos pesquisadores apontam que o primeiro nome dado a Lisboa foi Olisipo, porém não há um consenso sobre quem ou quando foi nomeada. Alguns declinam para a teoria dos fenícios, outros para Ulisses, outros para Júlio César e outros a dos visigodos. Porém, Lisboa vem de al-Lixbûnâ, nome dado pelos mouros, quando da invasão muçulmana.

Lisboa começou a ser habitada já no período Neolítico, o que é demonstrado por meio dos vários monumentos megalíticos que podem ser vistos ao redor da cidade. De lá para cá, muitos povos se estabeleceram na região como os celtas, fenícios (somente para o comércio de sal, pescados e os conhecidos cavalos lusitanos), os púnicos, romanos e mouros. No caso dos romanos, a região era tão estratégica, que a então Olisipo foi elevada à categoria de cidade romana, que no caso era uma nomeação importantíssima dentro das leis do Império Romano, pois as áreas designadas como cidade, não pagavam impostos à Roma, o que quer dizer que aqui era uma região altamente rentável aos cofres do Império apenas pela quantidade de mercadorias que circulavam em seu porto. Um dos vestígios ainda possíveis de conhecer são as Ruínas do Teatro de Olisipo datado do século I.

Com a decadência do Império Romano, os povos bárbaros invadiram a cidade até a invasão dos mulçumanos em 714. Um belo exemplar dessa dominação é o Castelo de São Jorge. A reconquista se deu somente em 1147, pelas mãos dos cristãos. Em 1385, Lisboa torna-se capital do Reino.

Leia também sobre a lenda portuguesa de Olisipo e Ulisses, que se refere ao início da cidade de Lisboa e como ela nasceu.

GRANDES NAVEGAÇÕES

Se há algum país que redesenhou o mapa mundial, esse país foi Portugal. Com sua ancestralidade marítima, o sal do mar nas mentes e corações, esse povo foi, nos séculos XV e XVI, o mais ousado, destemido e desbravador do até então desconhecido Oceano Atlântico. E toda essa transformação se deu pelas mãos de D. João II, quando subiu ao trono em 1481 e fez de seu reino um centro tecnológico na área naval. Para avançar nas pesquisas náuticas, D. João II trouxe muitos estudiosos de regiões da Itália, da Alemanha, da Catalunha, de Aragão e também do Oriente. Nas primeiras viagens foram descobertos os arquipélagos da Madeira, Açores e Canárias. Contornaram o Cabo das Tormentas (Cabo da Boa Esperança); chegaram à América do Sul e Ásia. Em todos os territórios conquistados instalou feitorias e explorou as riquezas disponíveis, escravos, especiarias, ouro e prata, elevando assim Portugal ao maior centro comercial do Ocidente. Dominou os mares e conseguiu fundar um enorme Império. Porém, tudo o que explorou de suas colônias eram produtos que serviam como matéria-prima básica, enquanto outros reinos, como o Britânico, apostaram no uso da tecnologia para produção de produtos manufaturados. Assim sendo, Portugal decaiu frente ao desenvolvimento dessas novas tecnologias. Além das dificuldades econômicas e as constantes ameaças da Espanha, Lisboa sofre um grande abalo: o terremoto de 1755.

Alegoria ao Terramoto de 1755, João Glama Strobërle. O pintor português nascido em Lisboa testemunhou o terremoto

TERREMOTO DE 1755

Depois da reconquista em 1640 do trono português que estava em poder da Espanha, Lisboa torna-se um centro religioso contando em sua área cerca de setenta conventos. A consequência dessa concentração de templos religiosos foi um conservadorismo desmedido, além da mácula da Inquisição que a transformou, no que antes uma capital cosmopolita e aberta, a uma capital fechada e autoritária, onde o braço forte da perseguição tirou a liberdade de trabalho e de culto a outra fé, prendendo ou afugentando os “diferentes”. Esse período tenebroso foi testemunha de outra catástrofe, só que natural: o Terremoto de 1755.

Considerado um dos terremotos mais devastadores da história, e sem dúvida o maior da história de Lisboa, calcula-se de 8,7 a 9 na Escala Richter e seguido de um maremoto com um tsunami de mais ou menos 20 metros de altura. Nunca uma capital da Europa sofreu tantos danos com catástrofes naturais. O terremoto aconteceu no dia de Todos os Santos, em 1° de novembro de 1755. As pessoas estavam, em sua maioria, nas muitas igrejas de Lisboa que conclamavam os fiéis às missas de um dia tão sagrado. Em sinal do que estava a vir, um forte ruído subterrâneo foi o início do que muitos chamaram o evento de “o mal está na terra”, seguido de um movimento no chão que simplesmente ruiu praticamente todas as estruturas das edificações.

Lisboa estava em ruínas, repleta de pessoas absortas, feridas e mortas. A partir daí, houve incêndios por toda a capital, assombrando ainda mais os moradores. Aos que ainda estavam de pé, puderam assistir as águas da foz do rio Tejo sumirem e depois sucumbiram ao violento tsunami que assolou ainda mais a já devastada cidade. Nunca houve consenso sobre o número oficial de mortos, tamanha a catástrofe. Sua reconstrução foi liderada por Sebastião José de Carvalho e Melo, o Marquês de Pombal.

INVASÃO NAPOLEÔNICA

Com as vitórias sucessivas das tropas de Napoleão Bonaparte no território europeu, Portugal, até então um reino neutro, deparou-se com a determinação de Bonaparte em fechar os portos portugueses, principalmente para barrar o comércio com os ingleses, prendê-los e confiscar seus bens. Por sua parte, os ingleses traçaram um plano para transferir a Família Real portuguesa para o Brasil e combater com o exército português, as tropas franco-espanholas. Mesmo com o trono de Portugal vazio, portugueses e ingleses conseguiram expulsar os franceses do país em 1811. Logicamente que esse período foi complicado para o Rei D. João VI que teve parte dos bens da coroa confiscados assim como os dos fidalgos que o acompanharam para a colônia.

QUEDA DA MONARQUIA

A história de Lisboa foi bastante impactada pois após o conturbado período em que a Família Real permaneceu no Brasil, Lisboa viveu uma época de muita cultura e vida social. O fado, cantado em vários clubes era a música da moda. Até que em 1910, em um golpe de estado, o último rei, D. Manuel II cai e a república é o novo regime político de Portugal. As motivações do Partido Republicano Português em destituir a monarquia foram: grandes gastos com a Família Real, a dominação dos projetos ingleses nas colônias portuguesas, a influência da Igreja e a ditadura do então Presidente do Conselho, João Franco.

DINASTIAS PORTUGUESAS

O período monárquico português compreendeu entre 1096 a 1910. As dinastias foram: de Borgonha (1096 a 1383); de Avis (1382 a 1581); de Habsburgo (1581 a 1640) aqui os espanhóis estavam no poder; de Bragança (1640 a 1836); e de Casa de Bragança-Saxe-Coburgo e Gotha (1836 a 1910).

Soldados portugueses na Frente de Combate na Flandres Francesa

PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL

Entre 1878 e 1911, Lisboa duplicou sua população (um pouco menos que o total de todos os habitantes de Portugal). Avenidas foram abertas e a modernização chegou, entretanto, parte de seus habitantes sofriam ainda com a falta de infraestrutura que não crescia concomitantemente. Com a Primeira Guerra Mundial em curso, houve um grande impacto na história de Lisboa, já que ela sofre com o desabastecimento de alimentos, inflação descontrolada e desemprego. Portugal entrou na guerra, pois o Eixo visava dominar as colônias portuguesas: Angola e Moçambique. Junto aos Aliados, Portugal combateu na frente da região de Flandres, Bélgica, onde sofreu muitas baixas no ataque alemão de abril de 1918.

GRIPE ESPANHOLA

A Gripe Espanhola, também chamada de Gripe Pneumônica, entrou em Lisboa em 1918, matando, em todo o território português, entre 50 a 100 mil pessoas, mais que todos os portugueses que morreram na Primeira Guerra Mundial. Lisboa, como qualquer cidade da época, não possuía um sistema de saúde e funerário capazes de suprir os acometidos pela influenza. Assim, a capital sofreu as consequências de mais uma catástrofe dentro de seus limites.

SEGUNDA GUERRA MUNDIAL

Lisboa teve papel fundamental nos rumos da Segunda Guerra Mundial graças a uma rede de espionagem e contraespionagem em seu território. Apesar da preferência aos ideais nazistas, o ditador português Antônio de Oliveira Salazar, respeitou o compromisso com a Inglaterra e permaneceu neutro no conflito. Porém, graças ao único porto europeu aberto, Lisboa tornou-se centro de atividades de informações de todos os lados e muitos espiões se concentraram aqui pela segurança e oportunidade de contatos com pessoas de várias nacionalidades.

Alguns exemplos que marcaram a história de Lisboa: segundo historiadores, no fatídico Dia D, a invasão dos Aliados no norte europeu, o agente duplo espanhol Juan Pujol Garcia, passou informações erradas para as tropas de Hitler, que concentrou seus exércitos em Pas-de-Calais, deixando menos fortificadas outras áreas da Normandia; e o iugoslavo Dusko Popov (conseguiu a informação da iminência do ataque a Pearl Harbor, mas foi desacreditado pelo FBI), que pode ter sido a inspiração de Ian Fleming para o personagem James Bond – 007. Fleming também passou por Lisboa, incumbido de investigar as ações de Francisco Franco, ditador espanhol.

Ilustração de Carlos Alberto Santos, pintor português que retratou como poucos a história e a cultura do país.

REVOLUÇÃO DOS CRAVOS

Em 1926, com o golpe militar, Portugal viveu uma ditadura tendo como ícone, Antônio de Oliveira Salazar, entre os anos de 1932 e 1964 (afastado por um derrame cerebral), onde seus ideais eram inspirados no fascismo italiano. Com uma nova Constituição, na qual suprimia direitos e liberdades, Salazar foi um forte oponente da independência das colônias africanas, como Angola, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe, Moçambique e Guiné-Bissau, tendo como consequências a formação de guerrilhas nos estados africanos. Seu sucessor foi Marcelo Caetano, que prosseguiu com a mesma política de seu antecessor.

Os conflitos nas colônias africanas aumentaram, causando um gasto enorme do erário público, e o descontentamento das Forças Armadas e da população em geral culminou em uma revolução no dia 25 de abril de 1974, denominada Revolução dos Cravos, que foi bastante relevante na história de Lisboa. Em consequência, Marcelo Caetano foi deposto e se exilou no Brasil. Subiu ao poder o general António de Spínola. Em comemoração à vitória, cravos foram distribuídos aos que lutaram contra a ditadura. Em 1976, o Primeiro Governo Constitucional de Portugal foi instituído.

Império português

Apesar de Portugal nunca ter se autodenominado como um Império, sua dominação abrangeu quase todos os continentes, começando com a conquista de Ceuta, em 1415, e perdurou até a devolução de Macau para a China em 1999.

Conquistas:
Espanha (Ceuta de 1415 a 1640);
Marrocos (Alcácer-Ceguer de 1458 a 1550);
Mauritânia (Arguim de 1461 a 1633);
Cabo Verde (de 1462 a 1975);
São Tomé e Príncipe (1470 a 1975);
Marrocos (Arzila de 1471 a 1589);
Marrocos (Tânger de 1471 a 1661);
Guiné Equatorial (Ano Bom de 1474 a 1778);
Fernando Pó (Guiné Equatorial de 1474 a 1778);
Mauritânia (Ouadane de 1487 até o século XVI);
Gana (São Jorge da Mina de 1482 a 1642);
Brasil (de 1500 a 1822);
Índia (Índia Portuguesa de 1500 a 1961);
Moçambique (de 1501 a 1975);
Tanzânia (Zanzibar de 1503 a 1698);
Tanzânia (Quiloa de 1505 a 1512);
Marrocos (Santa Cruz do Cabo Gué de 1505 a 1541);
Marrocos (Aguz de 1506 a 1525);
Marrocos (Mogador de 1506 a 1510);
Iêmen (Socotorá de 1506 a 1512);
Omã (Mascate de 1507 a 1650);
Marrocos (Safim de 1508 a 1541);
Malásia (Malaca de 1511 a 1641);
Indonésia (Macassar de 1512 a 1665);
Marrocos (Mazagã de 1514 a 1769);
Irã (Ormuz de 1515 a 1622);
Sri Lanka (Ceilão de 1518 a 1658);
Índia (Coulão de 1518 a 1661);
Índia (Paliacate de 1518 a 1610);
Indonésia (Ternate de 1522 a 1575);
Marrocos (Azamor de 1523 a 1541);
Timor Leste (de 1533 a 2002);
Índia (Bombaim de 1534 a 1661);
China (Macau de 1553 a 1999);
Gana (Acra de 1557 a 1578);
Angola (de 1575 a 1975);
Indonésia (Tidore de 1578 a 1605);
Guiné-Bissau (Cacheu de 1588 a 1974);
Quênia (Mombaça de 1593 a 1729);
Índia (Masulipatão de 1598 a 1610);
Irã (Queixome de 1621 a 1622);
Senegal (Ziguinchor de 1645 a 1888);
Uruguai (Colônia do Sacramento de 1680 a 1777);
Benim (São João Baptista de Ajudá de 1680 a 1961);
Guiana (França de 1809 a 1817);
Guiné-Bissau (Guiné Portuguesa de 1879 a 1974); e
Marrocos (Protetorado Internacional de Tânger de 1923 a 1956).

Foto USA Reise blogger

UNIÃO EUROPEIA

Em 1986, Portugal entra para a União Europeia, e, na Zona do Euro, em 1999. Com uma democracia consolidada, Lisboa é uma das mais belas capitais da Europa e a que menos desigualdade social possui. Sua rica história está preservada nas ruas antigas e em seus monumentos. Uma das capitais mais visitadas, é refúgio de artistas e da alta sociedade. Suas especificidades a tornam um destino dos mais atrativos. A sempre ensolarada Lisboa é sinônimo de cultura, lazer e bom acolhimento aos que desejam conhecê-la em todas as suas nuances.

Incluimos uma galeria de fotos que retrata um pouco da história de Lisboa. As imagens são da Fundação Calouste Gulbenkian

Rua Garret

Praça Dom Pedro IV

Para mais informações sobre turismo, história e arte na Europa, visite a nossa página com Dicas Culturais do Velho Mundo.

Renata Weber Neiva

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