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Sinhá Olímpia: patrimônio humano de Ouro Preto e do Brasil

Foto Milton Tropia

O amor tem sido cantado, através dos séculos, por trovadores, poetas, escritores… pelo mundo inteiro. As histórias de amor mais famosas são as trágicas. Talvez porque o amor, em sua definição humana, represente de certo modo, uma tragédia. Deixamos de viver de maneira individual, e passamos a viver também por e para mais alguém.

Não é raro que as histórias de amor mais conhecidas terminem em morte. Romeu e Julieta que o digam! Saindo da ficção, para o mundo real, acontece o mesmo. Já ouviram falar que, casais que passam muitos anos juntos, geralmente, despedem-se deste mundo em curto intervalo de tempo?

Bom, a história que eu vou contar hoje para vocês é de uma personagem que experimentou a amargura de um amor proibido, e personificou-o em doce e colorida poesia viva.

Olympia Angélica de Almeida Cotta, nasceu em um distrito de Mariana, Minas Gerais, em 1889. Filha de pais abastados, teve uma vida confortável, em uma época em que poucos tinham a chance de ter o básico para sua sobrevivência.

Na juventude, a bela Olympia se apaixonou perdidamente por um estudante do curso de Farmácia, em Ouro Preto.  A família de Olympia, preocupada em preservar o patrimônio e a reputação da filha, proibiu o romance porque o jovem estudante não pertencia à mesma classe social.

O jovem estudante, cuja identidade permanece desconhecida até hoje, faleceu pouco tempo depois. Causa da morte? Coração partido. Neste mesmo instante, morria Olympia Cotta e nascia, a famosa Sinhá Olimpia.

Olímpia passou o resto de sua vida vagando pelas ladeiras ouro-pretanas, trajando roupas coloridas e um chapéu que ora era ornado por penachos, ora por flores. Começou a viver em seu mundo particular, onde não havia dor, tristeza, amores não correspondidos, ou mesmo aparências sociais a serem sustentadas a qualquer custo.  

Este despertar da Sinhá Olímpia, me faz lembrar o poema “Vou-me embora para Pasárgada”, de Manuel Bandeira.

“Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei

Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconsequente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive

E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!
E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d’água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar
Vou-me embora pra Pasárgada

Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcaloide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar

E quando eu estiver mais triste
Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
— Lá sou amigo do rei —
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada”.

Sinhá Olímpia, como passou a ser conhecida, declamava poemas pelas ladeiras da Ouro Preto, em troca de dinheiro, e eventualmente uma pinguinha. Era uma figura conhecida e icônica na região. Ela era uma releitura das damas de outros tempos, com a autenticidade e rebeldia que as outras, certamente não tinham. Era a personificação do Barroco: exagerada, rebuscada, profunda e apaixonada. Tinha em sua imaginação, amigos importantes como os inconfidentes e os poetas mineiros, além de personagens da monarquia portuguesa.

Sinhá Olimpia era muitas pessoas. E quem era ela realmente? Nunca saberemos.

Rita Lee, a mais notável das representantes femininas do rock brasileiro, classificou Sinhá Olimpia como sendo a primeira hippie do Brasil. Sinhá foi também homenageada na década de 90, no carnaval carioca, pela escola de samba Mangueira.

Sinhá Olímpia faleceu em 1976, aos 87 anos. Infelizmente, não pude conhecê-la. Ela faleceu 10 anos antes do meu nascimento. No entanto, tenho grande admiração por tudo o que representa: verdade, autenticidade, poesia, magia. Sua presença e história ainda ecoam pelas terras dos Inconfidentes.

Ouça Sinhá Olímpia

Samba Enredo 1990 – E Deu a Louca No Barroco
G.R.E.S. Estação Primeira de Mangueira (RJ)

Viveu

Em vila rica a cinderela
Entre sonhos e quimeras
De raríssimo esplendor

Brilhou

Como o sol da primavera
E a beleza de uma flôr

E assim | bis

Imperando nos salões
Em seu doce delírio
Conquistou corações
Acalentou o ideal da liberdade
E transformou toda mentira
Na mais fiel realidade

Vai…

Contar a história do infinito

Vai…

Não haverá amanhecer
Vai dizer que foi esculturada
Que sofreu por amor
E foi amada

Musa inspiradora
Luz de uma canção
Bailando na imensidão

Sinhá Olímpia

Quem é você
Sou amor sou esperança
Sou mangueira até morrer

Ouça o samba enredo “E deu a louca no Barroco” da Mangueira que homenageou Sinhá Olympia, 1990:

Sinhá Olímpia – De Princesa à Plebeia – Filme Documentário

Emiliana Fonseca, mineira de nascença e baiana de coração. É deslumbrada pelo povo brasileiro e pela riqueza de sua cultura, história e sabedoria popular. A coluna “Gente da Terra ” traz ao leitor a oportunidade de conhecer ilustres (e não tão ilustres) moradores de localidades espalhadas pelo nosso Brasil.

Emiliana Fonseca

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